PABLO ESCOBAR, MEU PAI – CAPÍTULO 9: Fazendo demais pelos amigos


O conteúdo aqui traduzido foi tirado do livro Pablo Escobar, meu pai, de seu filho, Juan Sebastián Marroquín, sem a intenção de obter fins lucrativos. — RiDuLe Killah















CAPÍTULO 9









FAZENDO DEMAIS PELOS AMIGOS













Palavras por Juan Sebastián Marroquín











Em Julho de 1981, um coronel da Quarta Brigada do Exército de Medellín 
entregou a um amigo de meu pai uma fita cassete com várias gravações em que militantes do M-19 (Movimento 19 de Abril, organização de esquerda na Colômbia) falavam de sequestrar um mafioso e cobrar um resgate muito alto.

Meu pai recebeu a fita. Nessa época ele já havia formado seu poderoso 
aparato militar, com rapazes muito jovens recrutados das regiões mais degradadas da cidade e que haviam começado a trabalhar com ele como seguranças, pistoleiros, administradores de rotas do tráfico e também como meus guarda-costas, embora eu tivesse apenas quatro anos de idade.

Após escutar com atenção a gravação, que não deixava dúvidas a respeito das 
intenções dos guerrilheiros, meu pai rapidamente averiguou que fora a divisão de Medellín do M-19 que dera a ordem do sequestro e resolveu ir atrás dos responsáveis.

Com os contatos que acumulara no submundo do crime e nos órgãos de 
inteligência do governo, em uma semana meu pai e seus homens identificaram catorze guerrilheiros, entre eles: Martha Elena Correa, Luis Gabriel Bernal, Elvensio Ruiz – que “Pinina” encontrou hospedado numa espelunca em Bogotá – e Jorge Torres Victoria, de apelido “Pablo Catatumbo”.

Várias vezes meu pai me dissera que admirava o M-19 porque havia dado 
golpes de grande repercussão, como a tomada da embaixada da República Dominicana e os roubos da espada do libertador Simón Bolívar e de quatro mil armas de uma guarnição militar, mas acima de tudo porque no começo o grupo assaltava caminhões de leite e distribuía o produto pelos bairros pobres de Bogotá. Mas uma coisa era o M-19 mexer com o governo; outra muito diferente era se meter com a máfia.

Correa, Bernal, Ruiz e Catatumbo foram levados sem violência para a sede 
da Antioquia Al Día, uma rede televisiva regional que tinha o próprio telejornal, que meu pai havia comprado para entrar de cabeça nos meios de comunicação e no jornalismo, que o fascinavam.

Essa era a fachada, porque na parte de trás da edificação funcionava um 
escritório do crime de meu pai. Ali, falou com os guerrilheiros a respeito do sequestro que planejavam e os fez ver que a máfia do narcotráfico era muito poderosa, e que ele dispunha de um forte braço militar que não se deixaria intimidar por ninguém; em outras palavras, lhes disse que era o rei de Medellín.

Sobre esse encontro com os membros do M-19, meu pai me contou que 
convocou oitenta bandidos, muniu-os de armas novas e mandou que apenas as deixassem à vista, porque seu objetivo era amedrontá-los, não matá-los. Ainda assim, disse-lhes para ficarem alertas no caso de um confronto não desejado.

Os quatro integrantes do M-19 chegaram pontualmente ao encontro, a bordo 
de um carro discreto, do qual saíram visivelmente nervosos. Elvencio Ruiz trazia nas mãos uma granada sem o pino.

Apesar da ameaça implícita da granada, que poderia explodir a qualquer 
momento, e do olhar ameaçador do grupo de meu pai, o encontro ocorreu de maneira bastante cordial, e no fim os guerrilheiros se comprometeram a não se meter com a máfia ou com suas famílias.

– A coisa comigo é muito fácil, senhores. Vocês não se metem comigo e eu não me meto com vocês. Não se enganem, prestem atenção: vocês não mexeram nem um dedo e eu já sei das suas intenções; então nem pensem em passar por cima de mim porque posso acabar com vocês todos, ou por acaso algum dos nomes, endereços ou telefones do grupo de vocês está errado aqui? – meu pai disse, olhando nos olhos de Elvencio Ruiz.

Para acabar de vez com a moral deles, sacou uma caderneta e leu um por um 
os nomes dos catorze guerrilheiros que integravam a divisão de Medellín do M-19, bem como os lugares por onde andavam e seus esconderijos. Por fim, conforme me contaram alguns de seus homens, deu entre 10 mil e 15 mil dólares para os quatro guerrilheiros.

A proximidade entre meu pai e os homens do M-19 se manteve com o tempo, a ponto de ele ter enviado Pablo Catatumbo para administrar um posto de gasolina perto de Miami Beach. Naquela época, os Estados Unidos enfrentavam uma crise de falta de combustível e não era fácil conseguir gasolina nos postos; por isso, as autoridades haviam decidido que ela seria fornecida num sistema rodízio entre os números pares e ímpares das placas. Comprando o posto, meu pai resolveu um problema logístico de sua organização, porque a partir de então todos os veículos que distribuíam a cocaína em diferentes partes da cidade passaram a abastecer ali. Catatumbo ficou cinco meses nos Estados Unidos e depois voltou para a Colômbia.

No entanto, o pacto com o M-19 foi quebrado em 12 de Novembro de 1981, 
uma Quinta-feira, com o sequestro de Martha Nieves Ochoa, um feito que meu pai qualificou como um ato de traição e uma afronta a ele.

Assim que Jorge Luis terminou de contar, ao telefone, que três homens 
armados haviam sequestrado sua irmã, meu pai foi para a casa no bairro do Prado, onde dom Fabio morava, e liderou as investigações para determinar quem estava por trás do sequestro.

Logo descobriu que eram os integrantes do M-19. Soube disso quando viu as 
fotografias do anuário dos formandos da escola dela, e reconheceu duas pessoas com quem havia se reunido quatro meses antes: Martha Elena Correa e Luis Gabriel Bernal.

Meu pai planejou os passos seguintes, porque certamente os guerrilheiros exigiriam uns 12 milhões de dólares pelo resgate de Martha Nieves. Não demoraram a perceber que na verdade aqueles subversivos achavam ter encontrado nos traficantes de drogas e em suas famílias uma fonte fácil e segura para financiar suas atividades. Chegaram a essa conclusão porque, além da tentativa de sequestro neutralizada por meu pai, também estiveram perto de capturar uma senhora de sobrenome Molina em Medellín e, em Armenia, Carlos Lehder, que conseguiu escapar com um ferimento de bala em uma tentativa de sequestro em sua fazenda.

Nos dias seguintes, meu pai convocou uma grande cúpula do narcotráfico na 
fazenda Nápoles – estiveram presentes em torno de duzentos barões do tráfico de todo o país e alguns oficiais do Exército, entre os quais foi consenso a decisão de não pagar pela soltura de Martha Nieves, e sim resgatá-la na marra.

Assim, juntaram-se à operação de resgate “El Mexicano”, Lehder e Fidel 
Castaño, que lhes contou que seu pai havia sido sequestrado e assassinado pelas Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), e por isso concordava com a solução armada. A história de vida de Fidel comoveu meu pai e a partir daquele momento os dois ficaram muito próximos.

Tendo tomado a decisão, meu pai assumiu o papel de coordenador e chefe do 
grupo de resgate, ao qual deram o nome de Morte aos Sequestradores, o MAS. Para tornar mais fácil a operação, Gerardo “Kiko” Moncada emprestou um enorme galpão situado bem ao lado da Paróquia do Perpétuo Socorro, na rua Palacé. Enquanto isso, para proteger a família, meu pai fez minha tia Alba Marina sair da Universidade de Antioquia, porque ficara sabendo que Martha Nieves tinha sido sequestrada com a participação de uma estudante que, tempos antes, fora sua colega de classe.

Colocando em termos militares, meu pai entrou em estado de aquartelamento e adotou o toque de recolher. Nossa casa no bairro de Santa María de los Ángeles se encheu de seguranças, que nos protegiam vinte e quatro horas por dia, e 95% das saídas foram restringidas porque não se sabia como o M-19 reagiria. Meu pai costumava chegar sem ter dormido às oito ou nove horas da manhã, depois das operações de busca e invasões, que ocorriam quase todas as noites. Ele, “Pinina”, “Paskín”, “Chopo”, “La Yuca” e “Otto” usavam uniformes do exército e saíam em caminhões militares do Batalhão de Villa Hermosa, onde a cúpula do MAS se reunia frequentemente. Nessa época, a guarda pessoal de meu pai passou de quatro para dez homens, e começaram a me levar para o jardim de infância em uma caminhonete Toyota Land Cruiser blindada. Lembro que do lado de fora da Montessori School havia uma escolta armada permanente.

– Pablo, vão matar você, cadê seu amor pelo seu filho? Você vai acabar 
sendo morto pelos seus amigos... como sempre. Você nem apareceu aqui em Dezembro. Como a gente fica? Não vamos passar o Natal com você? – minha mãe se queixava.

– Meu amor, acontece que se eu não colaborar agora, como é que vou pedir ajuda mais para frente? Temos que ficar juntos nessa, para que não volte a acontecer – respondia meu pai, que havia assumido o resgate de Martha Nieves como se ela fosse sua própria irmã.

Fidel Castaño, Lehder, mafiosos de outros cantos do país e oficiais do 
Exército e da polícia interessados no avanço do resgate compareciam dia e noite ao galpão emprestado por Moncada. A família Ochoa inteira ficou praticamente trancafiada e cercada por homens que a protegiam, sem sair de sua propriedade em Envigado, onde recebiam as ligações de extorsão e gravavam as conversas com os sequestradores.

Ao mesmo tempo, os guarda-costas mais próximos a meu pai recrutaram 
como informantes dezenas de jovens de Medellín. Em poucos dias, pelo menos mil pessoas haviam se somado às buscas por Martha Nieves.

Logo que meu pai e seus homens começaram a caçada feroz aos 
sequestradores, nos jornais regionais começaram a aparecer grandes anúncios nos quais o MAS informava sua criação, alertava a respeito do sequestro de Martha Nieves Ochoa e dizia, taxativamente, que não daria um único peso ao M-19 pelo resgate.

Pouco depois, Lehder deu dinheiro para várias publicações, nas quais explicou as razões para a existência do MAS e o porquê de sua luta contra o sequestro. De igual modo, num Domingo da segunda semana de Dezembro foram lançados, de um aviãozinho de meu pai, milhares de panfletos sobre os estádios Atanasio Girardot de Medellín e Pascual Guerrero de Cali, com o aviso de que o M-19 não receberia um único peso como resgate pela sequestrada.

A força militar do MAS começou a ser percebida com o passar dos dias, por 
causa da eficaz aliança entre meu pai, seus homens, o Exército e a polícia. Dezenas de operações de busca começaram a ocorrer em diversos lugares da cidade e no Valle del Aburrá, nas quais diversos suspeitos foram capturados e levados ao quartel do MAS, onde foram interrogados com métodos violentos.

Ao mesmo tempo, meu pai mandou comprar mais de cento e cinquenta 
rádios de longo alcance e entregar para os rapazes recém-chegados, e mandou que ficassem próximos de telefones públicos esperando para ver se alguém se aproximava para fazer alguma ligação relacionada ao sequestro. Perto destes, dentro de um veículo, outros rapazes esperavam um sinal para sair e deter o suspeito.

A estratégia funcionou, porque os guerrilheiros se comunicaram várias vezes com a família para negociar a soltura. Como o telefone da família estava grampeado, a polícia rastreava o número e o lugar de onde a ligação havia partido e avisava imediatamente os homens de meu pai; dessa maneira, vários suspeitos foram detidos.

As capturas e os interrogatórios conduziram a uma casa no bairro La 
América de Medellín, onde homens de meu pai e do Exército tiveram um confronto armado com três guerrilheiros, que morreram no local. Lá, encontraram a carteira de identidade de Martha Nieves, mas ela já havia sido transferida para outro local.

A intensa busca indicou que dali ela havia sido levada para a região próxima de San Antonio de Prado, a sudoeste de Medellín, local em que apreenderam acidentalmente a caminhonete de onde o M-19 interceptava, naquela época, o sinal da tevê aberta; dali, foi levada para os municípios de La Estrella e Montebello. O tempo passava, nada de a encontrarem; por isso, e numa clara mensagem de que estavam no encalço dos sequestradores, na noite de 30 de Dezembro o MAS deixou Martha Correa algemada na porta principal do jornal El Colombiano, com um cartaz que a apontava como sequestradora.

Meu pai passou aquele fim de ano com os Ochoa, mas se propôs a atacar já 
nos primeiros dias de Janeiro de 1982. A família de Martha Nieves publicou um anúncio em vários jornais com uma mensagem curta e direta: “A família Ochoa Vásquez informa que não está disposta a negociar com os sequestradores do M-19 que têm mantido a senhora Martha Nieves Ochoa de Yepes cativa. E não pagará nenhum valor por seu resgate, mas oferece a soma de 25 milhõJaneiroes de pesos (25 milhões de dólares) a qualquer cidadão que dê alguma informação sobre seu paradeiro”.

Apesar de tudo, o anúncio não deu resultados, e o MAS acabou perdendo a pista na busca; os guerrilheiros detidos no galpão – uns vinte e cinco – deram mostras reais de não saber onde estava Martha Nieves, e alguns líderes do M-19 que naquele momento estavam na prisão La Picota de Bogotá enviaram uma mensagem na qual negavam saber o paradeiro.

Após a perda do rastro de Martha Nieves, a família Ochoa se mobilizou 
muito rápido e conseguiu a colaboração do ex-presidente da Venezuela, Carlos Andrés Pérez, que, por sua vez, falou com o general Omar Torrijos, o homem mais poderoso do Panamá.

Torrijos encarregou o chefe da inteligência do Exército, o coronel Manuel 
Antonio Noriega, de tentar entrar em contato com os chefes do M-19, que estavam havia muito tempo naquele país.

O plano foi eficaz porque, duas semanas depois, após uma difícil negociação, o M-19 aceitou receber 1,2 milhões de dólares pela libertação de Martha Nieves. O acordo incluía soltar as vinte e cinco pessoas que meu pai mantinha reclusas no quartel do MAS; Elvensio Ruiz foi deixado com vida dentro de um saco nas imediações do aeroporto de Guaymaral, no norte de Bogotá, pois estava detido na Escola de Cavalaria do Exército.

Desse modo, 123 dias depois, Martha Nieves foi encontrada sã e salva no 
município de Génova, estado de Quindío, e viajou imediatamente para sua casa em Medellín.

Ao contrário do que se poderia pensar, o episódio não desencadeou uma 
guerra entre meu pai e o M-19.

Pelo contrário, nos meses seguintes surgiria entre eles uma aliança que 
causaria muitos estragos no país.









Manancial: Pablo Escobar, meu pai

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